Prefeitura de SP regulamenta emissão de notas fiscais para honorários de sucumbência
Os honorários de sucumbência encontram amparo legal no art. 85 e seguintes do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) e constituem corolário do princípio da causalidade, que atribui a responsabilidade pelo custo do processo àquele que, por ação ou omissão, deu causa à instauração da lide.
De fato, a legislação processual civil estabelece que, como regra, a parte vencida em determinada ação judicial deve não apenas ressarcir a parte vencedora de todas as despesas processuais por ela antecipadas, mas também pagar honorários de sucumbência ao patrono da parte que se sagrou vitoriosa.
Portanto, em resumo, honorários de sucumbência são valores devidos pela parte vencida, ao advogado da parte vencedora ao final de determinada demanda judicial.
Disso decorre que o liame entre a parte vencida e o advogado da parte vencedora – consistente na obrigação de pagar quantia certa a título de honorários de sucumbência – claramente possui natureza distinta da prestação de serviços pelo advogado ao seu cliente (parte vencedora).
Não obstante a clareza dessa conclusão, a Prefeitura de São Paulo insiste em exigir a emissão de nota fiscal para documentar o recebimento de honorários de sucumbência pelas sociedades de advogados.
Com efeito, o Município de SP já se manifestou, em mais de uma oportunidade, no sentido de que tais verbas seriam receitas tributáveis para fins de ISS e, justamente por essa razão, o escritório que as recebe deveria emitir nota fiscal contra o seu cliente (nesse sentido, cite-se a recente Solução de Consulta SF/DEJUG nº 20, de 04.07.2022).
Ocorre, contudo, que, diferentemente do que sustenta a Prefeitura, os honorários de sucumbência não se subsomem ao conceito de “preço do serviço” para fins de incidência do ISS, circunstância essa que vem sendo reconhecida pelas irretocáveis decisões judiciais recentemente proferidas sobre a matéria.
Ainda que assim não fosse, fato é que o próprio cumprimento da orientação constante da Solução de Consulta acima referida se mostrou inviável em termos práticos.
Isso porque, como visto, a Prefeitura inicialmente pretendeu exigir que os escritórios indicassem os seus próprios clientes como tomadores dos serviços nas notas fiscais relativas aos honorários de sucumbência, o que é absolutamente impraticável, pois quem paga os honorários sucumbenciais não é o referido cliente, e sim terceiro estranho à relação jurídica contratual de prestação de serviços original (i.e., a parte vencida no processo judicial).
Diante da absoluta inexequibilidade da orientação contida na Solução de Consulta SF/DEJUG 20/2020, a Secretaria Municipal de Fazenda editou a Instrução Normativa SF/SUREM nº 4, de 15.02.2023), que passou a disciplinar a declaração dos honorários de sucumbência nas notas fiscais emitidas por prestadores do serviço de advocacia no município de São Paulo.
A IN em questão entrou em vigor na data de sua publicação (16.02.2023) e não é aplicável a exercícios anteriores. Vale registrar que, em 30.12.2022, foi publicada a Lei nº 17.875/2022, que anistiou as infrações cometidas até a data da sua publicação no que se refere ao descumprimento da obrigação acessória de emitir, em cada operação, nota fiscal de prestador de serviços correspondente aos honorários advocatícios sucumbenciais.
O ato normativo em questão faculta (já que no entendimento da Prefeitura de SP a regra é que a NF seja por evento, e para o cliente) a emissão de uma única nota fiscal por mês, com o valor total bruto recebido a título de honorários de sucumbência e estabelece uma série de regras para a emissão da referida nota, entre os quais se destacam:
1. O contribuinte deverá preencher o campo “valor total da nota” com o somatório dos valores relativos a honorários de sucumbência devidos durante o mês, considerando-se o montante bruto total decorrente dos honorários sucumbenciais recebidos, sem nenhuma dedução;
2. O contribuinte deverá adotar como “data da prestação” o último dia do mês e seguir o padrão adotado para o preenchimento das demais Notas Fiscais de Serviços Eletrônicas (NFS-es), exceto quanto à indicação do tomador do serviço, cujo campo deverá conter os dados de identificação do prestador, isto é, da própria sociedade de advogados;
3. Deverão constar no campo “discriminação dos serviços”, as informações de número dos processos judiciais, os valores de honorários sucumbenciais de cada processo e, salvo nos casos de segredo de justiça, a identificação dos clientes que tenham integrado as respectivas lides;
4. Caso o número de linhas do campo “discriminação dos serviços” seja excedido, os advogados devem manter à disposição da Administração Tributária “registros contábeis auxiliares” que possibilitem a identificação das receitas eventualmente sujeitas à tributação do ISS; e
5. Os registros auxiliares devem ser informados por meio de elaboração de “relatório mensal analítico descritivo”, com o detalhamento de todos os processos judiciais, clientes e valores respectivos individualizados.
Por fim, caso os tomadores venham a exigir a nota fiscal relativa aos honorários de sucumbência, a referida IN determina que o documento deverá ser fornecido individualmente, nos termos da legislação pertinente. Note-se, contudo, que essa exigência carece de sentido lógico, pois, como visto acima, o pagamento de honorários de sucumbência não ocorre em contraprestação por serviço realizado, razão pela qual inexistem “tomadores” de serviços nessa hipótese.
Seja como for, vale destacar que, na prática, a obrigatoriedade de emissão de nota fiscal no que se refere aos honorários de sucumbência recebidos em nada impacta o recolhimento do ISS fixo por sociedades uniprofissionais (formalizadas pelo DSUP).
Isso não significa, porém, que (no entendimento da Prefeitura de SP, a nosso ver equivocado) as referidas sociedades de advogados estão desobrigadas da emissão de notas fiscais em relação aos honorários de sucumbência por elas recebidos. Nesse caso, poderão as sociedades de advogados facultativamente observar as disposições da nova IN cujos aspectos centrais foram delineados acima.
Coordenadores do Comitê de Direito Tributário
Daniella Zagari
Douglas Mota
Priscila Faricelli
Valter Lobato