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Lojistas dizem não encontrar pessoas com deficiência para cumprir a lei.

Levantamento do Cesit, da Unicamp, constatou que em 2023 cerca de 16% das empresas paulistas cumpriam as cotas para PCDs; Soneda é uma das poucas empresas com política específica para esses profissionais, que têm taxa de turnover menor que a média.

Que o varejo vive um apagão de mão de obra, por ‘n’ motivos, não é de hoje. Outra queixa é que também está mais difícil cumprir a lei de cotas para pessoas com deficiência (PCDs).

Há mais de 30 anos, conforme a Lei 8.213/91, empresas com mais de 100 colaboradores são obrigadas a contratar PCDs e estão sujeitas a multas em caso de descumprimento.

O número de PCDs na empresa depende do total de funcionários que emprega, em percentuais de 2% (até 200), 3% (de 201 a 500), 4% (de 501 a 1000) e 5% (acima de 1001).

Se já está mais difícil encontrar as mais variadas funções que exigem um comércio, dizem lojistas, imagina preencher vagas para quem tem alguma deficiência física, visual, mental.

Em janeiro deste ano, portaria emitida pelo Ministério do Trabalho e Previdência (MTP) e pelo Ministério da Economia (ME) atualizou as multas para quem não cumpre a lei de cotas.

De acordo com a portaria MTP/ME Número 23, de 16 de janeiro de 2025, as multas variam de R$ 3.215,07 a R$ 321.505,87 por colaborador PCD não contratado.

Os valores das multas estão preocupando alguns varejistas, até porque, especialmente depois da pandemia, dizem eles, ficou ainda mais difícil encontrar mão de obra de PCDs.

Com cerca de 2 mil funcionários, uma rede de supermercados que prefere não ser identificada, evidentemente para não alertar o MTE, informa que quer, mas não consegue cumprir a cota.

Pela lei, essa rede precisa ter em seu quadro de pessoal 100 PCDs, mas, segundo informa, tem 60, o que a classifica como uma empresa que descumpre a lei de cotas.

“Queremos contratar PCDs não apenas para cumprir cota, mas pela inclusão de todos no mercado de trabalho. Só que, infelizmente, não estamos conseguindo localizar as pessoas certas para as funções certas”, afirma um dos sócios da rede.

Lojistas ouvidos pelo Diário do Comércioexatamente com as mesmas afirmações, dizem que costumam divulgar as vagas internamente, em redes sociais, agências especializadas, mas, na maioria das vezes, com pouco ou nenhum sucesso.

“Eles até aparecem para conversar, mas quando ficam sabendo do local de trabalho, às vezes longe da casa deles, do salário e do serviço, acabam desistindo da vaga”, diz o sócio da rede.

Consultores de varejo que estão diretamente em contato com empresas de todos os tamanhos informam que, especialmente as grandes, não estão cumprindo as cotas para PCDs, e até já se acostumaram com o pagamento de multas, agora com valores atualizados.

“E não é por falta de vontade. Elas não conseguem contratar, mesmo com o apoio de agências de recrutamento. O agravante para o varejo é que há mais necessidade física do que intelectual do trabalhador”, afirma Marcos Hirai, consultor especializado em expansão de lojas.

O trabalho aos sábados e domingos, diz, também afugenta os potenciais candidatos. “O que as empresas gostariam é que houvesse uma amenização na legislação.”

Condições de trabalho

Assim como no caso da contratação de qualquer profissional, que requer que a empresa ofereça condições para a execução do trabalho, o mesmo tem de ser oferecido ao PCD.

Se a pessoa deficiente precisa de uma cadeira diferenciada para sentar, a empresa tem que oferecer, assim como um ambiente de acolhimento, evitando qualquer discriminação.

“Para que haja a contratação, tem de ter acessibilidade no ambiente de trabalho.

A empresa precisa fazer uma adaptação razoável, para que não haja barreiras”, diz Danielle Olivares Correa, coordenadora nacional da Promoção da Igualdade de Oportunidades e da Eliminação da Discriminação do Trabalho (Coordigualdade) do Ministério Público do Trabalho.

Para Danielle, não é que não existem PCDs para o preenchimento de vagas, o que falta é a acessibilidade para recebê-los e, por essa razão, as empresas não conseguem contratá-los.

Mariana Albuquerque de Novaes Campelo, advogada trabalhista do escritório Cerveira Advogados, com forte atuação no varejo, diz que a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho é um dos pilares para a efetiva concretização dos direitos fundamentais.

“A contratação de colaboradores com deficiência exige mais do que o cumprimento de uma meta percentual. A Lei Brasileira de Inclusão impõe o dever de garantir condições de acessibilidade e fornecimento de adaptações razoáveis no ambiente de trabalho”, diz.

16% cumprem cota

Levantamento do Cesit (Centro de Estudos Sindicais de Economia do Trabalho), da Unicamp, constatou que, em 2023, cerca de 16% das empresas paulistas cumpriam as cotas para PCDs.

De um total de 13 mil empresas obrigadas a cumprir a lei, pouco mais de 2 mil estavam regulares com relação ao preenchimento de vagas para pessoas com deficiência.

Das 183 mil vagas à disposição no estado de São Paulo, considerando as empresas em geral com mais de 100 empregados, 45,5% estavam ocupadas, ou cerca de 83,3 mil vagas.

No mesmo ano, de acordo com os dados que constam da pesquisa “Mapeamento e análise dos dados estatísticos do emprego das pessoas com deficiência no estado de São Paulo”, existiam 3,5 milhões de PCDs no estado de São Paulo, das quais 1,8 milhão estavam prontas para o trabalho.

O varejo está numa situação melhor do que a média de todos os setores, de acordo com a pesquisa. Isto é, 23% das empresas não cumpriam as cotas em 2023, ante 16%, no geral, e quase 70% das vagas disponíveis estavam ocupadas naquele ano, ante 45,5%, no geral.

No caso do varejo paulista, o total de vagas previstas para PCDs é da ordem de 37,3 mil, das quais cerca de 25,7 mil estão ocupadas, de acordo com o levantamento.

Discriminação

Existem PCDs para o mercado de trabalho, mas a discriminação é forte. Algumas empresas têm a inclusão em sua cultura, mas outras não acordaram”, diz Guirlanda Benevides, coordenadora do Núcleo de Pesquisas sobre Mercado de Trabalho e Pessoa com Deficiência do Cesit.

Recentemente, ela mesma viu uma empresa anunciando que tinha uma vaga para PCD, mas para alguém com “deficiência leve e boa aparência”.

“Isso mostra que a inclusão requer uma mudança de cultura e é um processo de muita luta, com divulgação de dados, palestras”, afirma Guirlanda.

Para ela, com os dados já levantados pelo Cesit e outros órgãos, é possível afirmar que existe descaso das empresas para as contratações de PCDs.

Casos

No dia 13 de fevereiro deste ano, uma confecção de São Paulo, com pouco mais de 240 funcionários, foi autuada em quase R$ 120 mil pelo MTE por não cumprir a cota para PCDs.

A empresa deveria ter em seu quadro de pessoal pelo menos oito pessoas com deficiência, ou 3% do número total de empregados, mas não tinha nenhuma.

A notificação foi enviada pelo Ministério do Trabalho e Emprego em setembro do ano passado, e, após trocas de mensagens por e-mail, a empresa obteve prazo de cinco meses para regularização, o que não ocorreu, e por isso aconteceu a autuação, de acordo com o MTE.

Advogados estão correndo para justificar que a empresa está se mexendo para realizar as contratações de PCDs, com divulgação em redes sociais e agências de recrutamento, com pouco sucesso. Até agora, contratou três pessoas com deficiência.

Em 2018, a Dafiti, empresa de e-commerce de moda, foi multada em pouco mais de R$ 180 mil pelo não cumprimento de cota de PCDS.

A empresa precisava de pouco mais de 70 pessoas com deficiência para cumprir a lei.

A 16ª Vara do Trabalho de São Paulo acatou os argumentos e decretou a inexigibilidade do débito, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região teve um entendimento contrário e determinou o pagamento da multa.

Alguns juízes estão tendo o entendimento de que, se a empresa comprova que está trabalhando para encontrar PCDs, o auto de infração pode ser anulado.

Outros já estão dando sentenças desfavoráveis às empresas, considerando que a lei, com quase 35 anos, precisa ser cumprida.

Entendem que incluir uma pessoa com deficiência no mercado de trabalho é um dos pilares para a efetiva concretização dos direitos fundamentais e da dignidade da pessoa humana.

De janeiro até 21 de abril deste ano, na região que inclui as cidades de São Paulo, Barueri, Guarulhos, Santos, Mogi das Cruzes e São Bernardo do Campo foram feitas 7 denúncias, ajuizadas 10 ações e realizados 5 TACs (Termo de Ajustamento de Conduta) envolvendo a lei de cotas para PCDs. No Brasil, os números são 262, 35 e 24, respectivamente, de acordo com o MPT.

Em dia com a lei

Com cerca de 2.200 empregados, a rede Hirota precisa ter 85 PCDs em seu quadro de pessoal. Até recentemente possuía 80 e agora já está em fase de admissão dos cinco restantes.

Luciana Ramos da Silva, analista de recrutamento da rede, diz que a empresa tem um trabalho anterior à contratação para que o PCD se encaixe em vagas e seja acolhido nos ambientes.

Divulgação de vagas em redes sociais e em agências especializadas, diz, ajuda a localizar as pessoas, mas não é só isso.

“Para trabalhar com deficientes, é preciso gostar, a empresa precisa ter a cultura da inclusão, e não pensar apenas em cumprimento de cotas”, afirma.

Há diferentes perfis de PCDs, diz ela, que é psicóloga, o que influencia na vaga a ser oferecida. “Uma pessoa com fobia social, por exemplo, não pode ser colocada para lidar com o público.”

Luciana criou um grupo de WhatsApp com todos os PCDs da rede e mantém contato direto com eles e com familiares. “Falo com eles todos os dias, até nos finais de semana.”

A rede Hirota procura contratar uma pessoa com deficiência todo o mês, uma conduta que independe do cumprimento de cotas.

“Procuro entender o que a pessoa com deficiência é capaz de fazer, identificar as limitações, mostro as funções que tenho na empresa para a adequação.”

A rede Hirota tem PCDs com cerca de dez anos de casa.

PCD na cultura da empresa

Em 2019, a rede Soneda, com 47 lojas de cosméticos no estado de São Paulo, decidiu fazer uma ação com deficientes intelectuais com a intenção de integrá-los ao time de colaboradores.

Num primeiro momento, foram chamadas 12 meninas para treinamento com maquiagem, vendas, tratamento capilar. Foi um sucesso, mas, com a pandemia, a ideia não vingou.

Há dois anos, a rede decidiu retomar o projeto e não imaginava que a empresa seria considerada um modelo de contratação e integração de deficientes intelectuais.

Luciana Karamachi, diretora de RH da rede, diz que todas as lojas da Soneda na cidade de São Paulo possuem um deficiente intelectual em seus quadros de funcionários.

Para atraí-los e integrá-los ao time, a empresa chamou duas consultoras especializadas no trabalho com PCDs e que atuam também com a família e com os funcionários da empresa.

Atualmente, a Soneda tem em seu quadro de pessoal cerca de 35 pessoas com deficiência, das quais 28 com deficiência intelectual. Outras 15 já estão em fase de contratação.

Uma vez por semana as profissionais conversam com psicólogos, familiares, gerentes de lojas para um acompanhamento do PCD e integração com o restante dos funcionários.

Luciana diz que os PCDs têm entre 20 e 30 anos e estão entre os funcionários mais engajados da rede, com taxa de turnover menor do que a média.

Uma das PCDs, que trabalha na loja da Soneda em Campinas (SP), a Tathi Piancastelli, é influencer e já conta com 182 mil seguidores no Instagram.

É contratada pelo regime de CLT e ganha por postagens específicas da loja. Recentemente, diz Luciana, ela anunciou em um evento que já possui autonomia financeira para morar sozinha.

“A nossa ideia é essa. Queremos trazer as pessoas com deficiência para a empresa, dando condições para que elas executem um trabalho e consigam se desenvolver”, afirma Luciana.

Fonte: dcomercio.com.br

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