Por: Ana Helena Pessoa e Danny Warchavsky Guedes (*)
Recentemente foi editada a Medida Provisória nº 1.171/23, instituindo novas regras de tributação sobre a renda no exterior de entidades estrangeiras controladas por pessoas físicas residentes no Brasil.
A MP impacta os planejamentos sucessórios que contemplam estruturas no exterior, como sociedades offshore e trusts, constituídos com o intuito de manter as reservas financeiras a salvo da pesada carga tributária brasileira, preservando-as para os familiares na sucessão.
Isso porque, hoje, não são tributados no Brasil os juros de investimentos feitos por meio de sociedades estrangeiras, enquanto o resultado não for remetido aos sócios. A tributação somente acontece se e quando tais sociedades transferirem os lucros para os sócios pessoas físicas.
Com isso, é possível manter os recursos aplicados no exterior, reinvestindo os lucros gerados, sem o pagamento de qualquer tributo no Brasil. É o chamado diferimento, que poderia se estender indefinidamente, inclusive para os herdeiros, após o falecimento do titular original.
Com a MP mencionada, os investimentos no exterior ficam equiparados aos realizados no Brasil, cujos rendimentos estão sujeitos à tributação.
Para isso, a MP estabeleceu uma tabela com alíquotas progressivas (0%, 15% e 22,5%) incidentes sobre o lucro das entidades estrangeiras controladas por pessoa física residente no Brasil.
A tributação ocorrerá no momento em que os lucros forem apurados, em 31 de dezembro de cada ano, independentemente de qualquer distribuição.
Os lucros apurados no passado serão tributados somente no momento da sua efetiva disponibilização para o sócio pessoa física, e as alíquotas aplicáveis serão aquelas vigentes no momento da disponibilização.
Já a variação cambial sobre o valor principal investido (o capital social) será tributada somente se houver a efetiva devolução de capital para o sócio residente no Brasil (por exemplo, por redução de capital ou liquidação da sociedade), por alíquotas que podem variar de 15% a 22,5%.
Por outro lado, a nova MP abre a possibilidade de o contribuinte atualizar o valor de seus bens e direitos no exterior, à alíquota de 10%. Essa opção só poderá ser exercida após a conversão em lei da MP e, se prevalecer a redação atual, terá um prazo de adesão até o dia 30.11.2023, com o pagamento do imposto nesta mesma data.
Importante mencionar que a utilização de recursos de sociedades estrangeiras para pagamento de despesas pessoais dos sócios também terá a natureza de distribuição de dividendos e estará sujeita à tributação.
A MP ainda está em tramitação no Congresso, e a expectativa é de que seja convertida em lei ainda neste ano, passando a produzir efeitos já a partir de 01/01/2024.
Diante deste cenário, os brasileiros detentores de quotas de sociedades situadas no exterior estão buscando alternativas para reduzir o impacto da tributação sobre os respectivos investimentos, revendo, ao mesmo tempo, planejamentos sucessórios que envolvam tais sociedades.
Uma boa alternativa para proteção dos ativos surge com o seguro de vida da pessoa física titular das quotas da sociedade. A apólice é contratada pela própria sociedade estrangeira, em valor equivalente ao seu investimento — ou parte dele, a critério dos sócios — e a pessoa em nome de quem estão declaradas as quotas é instituída como segurada, figurando seus herdeiros como beneficiários.
Nessa operação, a sociedade estrangeira disporá de seus recursos para adquirir a apólice do seguro.
Com isso, os recursos deixarão de ser da sociedade e passarão a compor a reserva de capital da seguradora, resultando num saldo de contas da empresa igual a zero ou próximo a isso, conforme a determinação dos sócios.
Trata-se de um seguro de vida tradicional, contratado mediante o depósito único de determinado valor, destinado a “comprar o risco” por um valor superior ao pago de prêmio, por prazo determinado — por exemplo, até o segurado completar 100 anos.
O segurado poderá efetuar o resgate total ou parcial de seu valor a qualquer momento, fazendo com que o respectivo capital retorne à conta da sociedade.
O interessante do seguro de vida é que o pagamento da apólice configura rendimento não tributável, como expressamente declarado no artigo 35, inciso XIII, do Regulamento do Imposto de Renda:
Este tipo de operação oferece, portanto, três grandes vantagens:
— Na ocorrência do sinistro, ou seja, na falta do segurado detentor das quotas da sociedade, os herdeiros recebem imediatamente o capital previsto na apólice, sem qualquer tributação, pois tem natureza de indenização, gerando uma economia de imposto de até 8% sobre o valor total (equivalente à alíquota do imposto de transmissão em Estados como Rio de Janeiro e São Paulo);
— Evita-se a incidência do Imposto de Renda sobre os rendimentos auferidos pela sociedade com seus investimentos;
— Na estipulação dos beneficiários, não é necessário observar a regra da sucessão brasileira, conferindo ao segurado total liberdade para determinar os percentuais das indenizações a quem bem entender.
A contratação de seguro de vida, portanto, se mostra como instrumento de planejamento sucessório e tributário eficaz e de fácil resolução, especialmente para os beneficiários, que recebem, em curto espaço de tempo, a indenização estipulada, sem necessidade de que tal quantia seja levada a inventário e sem o pagamento de imposto de transmissão.
Lamentavelmente, as seguradoras brasileiras não aceitam a contratação de seguro de vida para pessoas idosas, geralmente com mais de 65 anos. Daí a crescente procura por seguradoras estrangeiras.
Ana Helena Pessoa é sócia do Escritório Bastos-Tigre, Coelho da Rocha, Lopes e Freitas Advogados
Danny Warchavsky Guedes é sócios do Escritório Bastos-Tigre, Coelho da Rocha, Lopes e Freitas Advogados.
Fonte: conjur.com.br