O trabalhador que sofria de leucemia foi dispensado depois de voltar de licença médica, em 2020, e perdeu o plano de saúde. Ele morreu no ano seguinte.
Uma empresa que atua no setor de concessão de rodovias foi condenada a pagar indenização por danos morais no valor de R$150 mil, além de verbas trabalhistas, por ter dispensado um trabalhador com leucemia em 2020.
A indenização será paga aos representantes do espólio já que ex-empregado faleceu em 2021.
A 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) considerou que houve dispensa discriminatória do trabalhador, que era portador de doença grave. O colegiado acompanhou, por maioria, o voto da relatora, desembargadora Rosana Salim Villela Travesedo.
O ex-empregado narrou que começou a trabalhar para a empresa em 15/7/10, quando exercia a função de “servente de obra”. Demitido em 17/9/20, ajuizou uma ação na Justiça do Trabalho.
Alegou que a empresa, mesmo tendo conhecimento de que ele era portador de doença grave (leucemia melóide aguda) que demandaria controle e tratamento contínuo, o dispensou sem motivo – logo após o retorno de licença médica – e cancelou seu plano de saúde.
Na ação inicial, ajuizada em 27/3/21, o profissional requereu a reintegração da função exercida, com direitos e vantagens devidos, bem como o pagamento de indenização por danos morais por dispensa discriminatória no valor de R$ 207.276,73. Ele morreu em outubro do mesmo ano.
Em sua defesa, a empregadora argumentou que a dispensa do trabalhador não teve caráter discriminatório, tendo em vista que, quando ele foi demitido, já tinha obtido alta médica e gozava de boa condição de saúde.
Além disso, a empresa assinalou que o servente fazia parte de uma equipe que precisou ser desmobilizada em função do encerramento de determinadas obras e que outros integrantes da mesma equipe foram dispensados sem justa causa no mesmo dia do autor da ação.
Cancelamento do plano de saúde
Originalmente, na primeira instância o pedido do trabalhador havia sido negado.
Mas, no segundo grau, o caso foi analisado pela desembargadora Rosana Salim, que afirmou ser incontroverso o fato de a empresa ter amplo conhecimento da grave doença que acometeu o trabalhador e, ainda assim, ter efetuado a dispensa e cancelado seu plano de saúde.
A relatora citou em seu voto a Súmula nº 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), na qual se presume discriminatória a dispensa do empregado portador de doença grave.
“O entendimento do Tribunal Superior é no sentido de que o ônus da prova quanto à dispensa não discriminatória cumpre ao empregador(…). A doença que acometia o autor enquadra-se na hipótese de doença grave que suscita estigma e preconceito, razão por que se presume a dispensa discriminatória.”, observou.
“O combate à discriminação é uma das mais importantes áreas de avanço do Direito, característico das modernas democracias ocidentais.
Afinal, a sociedade democrática distingue-se por ser uma sociedade suscetível a processos de inclusão social, em contraponto às antigas sociedades que se caracterizavam pela forte impermeabilidade, marcadas pela exclusão social e individual.
Nesse sentido, o princípio da não discriminação, o respeito ao valor do trabalho e a subordinação da livre iniciativa à sua função social atuam como fatores limitadores à dispensa imotivada.
Configurada a odiosa conduta discriminatória empresarial quando da dispensa obreira, impõe-se ao empregador o ônus de arcar com a respectiva indenização, e consonância com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho”, assinalou a magistrada em seu voto.
A 5ª Turma acompanhou o voto por maioria.
Dessa forma, a companhia foi condenada a pagar a indenização correspondente aos salários, gratificações natalinas, férias acrescidas do terço constitucional e diferenças de FGTS, desde a dispensa até a data do óbito do trabalhador.
O dano moral foi fixado no valor de R$150 mil.
Ainda cabe recurso.
Fonte: Extra Globo